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Mauro Cid: ‘Grupo radical queria que Bolsonaro ordenasse golpe com apoio popular e dos CACs’

O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta segunda-feira (09/06) os interrogatórios dos réus apontados como integrantes do “núcleo crucial” da tentativa de golpe de Estado investigada após as eleições de 2022. O primeiro a prestar depoimento foi o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do então presidente Jair Bolsonaro (PL).

Durante o depoimento, iniciado às 14h, Cid confirmou que houve articulações com o objetivo de impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Ele também classificou os co-réus que ainda serão ouvidos como pertencentes a dois grupos: radicais, favoráveis ao uso das Forças Armadas para um golpe, e moderados, que apostavam na identificação de fraudes eleitorais.

Segundo o ministro Alexandre de Moraes, que é o relator do caso e leu trechos das declarações do depoente, o grupo radical defendia que Bolsonaro assinasse um decreto de intervenção, com apoio de civis armados (CACs) e respaldo popular, e esse grupo radical “romantizavam o Artigo 142 da Constituição Federal como fundamento para o Golpe de Estado” — frequentemente distorcido para justificar uma intervenção militar. Já o grupo menos radicais (“Moderados”) defendiam descobrir fraudes nas urnas.

Ao ser questionado por Moraes, o ex-ajudante de ordens apontou cada co-réu como:

  • Jair Bolsonaro, ex-presidente da República (tentavam influenciar);
  • Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Abin (moderados);
  • Almir Garnier, ex-comandante da Marinha (radical);
  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça (nem entrou nessa divisão);
  • Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (nem entrou nessa divisão);
  • Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa (moderados);
  • Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e candidato a vice na chapa de Bolsonaro em 2022 (moderados).

O tenente-coronel também confirmou que Bolsonaro leu e editou uma minuta de decreto com teor golpista. Embora não tenha apontado incentivo direto do ex-presidente aos atos de 8 de janeiro, Cid disse que Bolsonaro acreditava encontrar alguma fraude nas urnas eletrônicas e contava com um “clamor popular” para sustentar uma virada de narrativa.

Havia duas linhas: encontrar uma fraude concreta nas urnas ou, pela via dos mais radicais, convencer as Forças Armadas a aderirem a um golpe de Estado”, afirmou.

Cid acrescentou que, em todas as mensagens acessadas pela investigação, não há menção a fraudes reais.

“Não era algo explícito assim, como contei era a minha visão dos fatos do que estava acontecendo, sempre se teve a ideia que pudesse até o final do mandato aparecer uma fraude real nas urnas, tanto que em todas as minhas mensagens que foram abertas por parte da investigação, todas elas eu falo que não foi encontrado nenhuma fraude, tudo ficou no campo da estatística e de certa forma não ia acontecer nada, até porque não tinha apoio dos comandantes militares e não tinha subsidio de ter encontrado alguma fraude e de ser o estopim de algo”, afirmou Cid em depoimento.

Moraes questionou ainda se em determinado momento nessas reuniões, até 31 de dezembro, algum comandante, ministro ou assessor, apontou alguma fraude real nas urnas eletrônicas. Mauro Cid respondeu:

“O que apareciam eram estatísticas, os dados eram tirados do TSE, trabalhados em computadores para tentar achar alguma coisa que pudesse levar a uma fraude, mas não se conseguiu provar nada”, deu prosseguimento Mauro Cid.

O magistrado também perguntou quem era o elo entre Bolsonaro e os manifestantes acampados em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília. Cid respondeu que o então presidente se manteve recluso após a derrota eleitoral, e que quem fazia esse contato era o general Walter Braga Netto:

“Ele passava todas as manhãs no Alvorada para atualizar o presidente”.

Sobre o relatório técnico do Ministério da Defesa sobre o sistema eleitoral, elaborado sob comando de Paulo Sérgio Nogueira, Cid contou que Bolsonaro pressionava por um documento com teor mais incisivo, sugerindo fraude. O resultado final, segundo ele, foi um “meio-termo” entre a proposta do general e o desejo do ex-presidente.

O depoimento também tratou de uma reunião com militares exaltados, que discutiam ações mais drásticas após as eleições. Cid minimizou o conteúdo da conversa:

“Naquele momento, era só bravata. Conversas de militares radicais, ideias ao vento. Só depois, com os acontecimentos reais, é que talvez aquilo tenha ganhado alguma forma.”

Desde que firmou acordo de delação premiada em 2023, Mauro Cid já alterou sua versão dos fatos pelo menos cinco vezes. Ainda assim, seu depoimento é considerado peça-chave pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pela Polícia Federal (PF), que basearam parte da acusação em suas declarações.

A Primeira Turma do STF — formada pelos ministros Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Alexandre de Moraes e Flávio Dino — reservou os cinco dias desta semana para a oitiva dos réus.

Confira a ordem dos depoimentos:

  1. Mauro Cid, delator e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro;
  2. Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
  3. Almir Garnier, ex-comandante da Marinha;
  4. Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança do Distrito Federal;
  5. Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
  6. Jair Bolsonaro, ex-presidente da República;
  7. Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
  8. Walter Braga Netto, general do Exército e ex-ministro de Bolsonaro.

Foto: Mauro Cid, na matéria em destaque. Imagem: Reprodução/TV Justiça.

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